As ruas estão vazias. As camisetas verde-amarelas da
CBF voltaram para os armários. As panelas estão silenciosas. Tudo voltou a ser
como antes no cenário político. As velhas raposas retornaram aos postos do
poder. O país recuperou a tradicional política da ordem e do progresso.
A ordem foi restaurada por um ministério de homens
brancos, ricos e de opiniões conservadoras. Homens tementes a Deus, defensores
da moral e dos bons costumes, mas apenas defensores, uma vez que não servem de
exemplos dos valores que pregam. Ordenaram às mulheres o retorno às atividades
domésticas, aos negros a submissão aos espaços inferiores, aos LGBT’s a condição
de marginais e transgressores dos padrões da moralidade, aos artistas o lugar de
desocupados, condenando os “esquerdistas”, “bolivarianos” e “parceiros de Cuba”
como corruptos e inimigos da família.
Para preservar a ordem, preparam a aprovação de
algumas medidas que consideram fundamentais, como a redução da maioridade
penal, que, segundo creem, contribuirá decisivamente para diminuir a violência no país; o projeto “escola sem
partido”, para acabar com a doutrinação de esquerda das crianças nas escolas; a
mudança do estatuto do desarmamento, a fim de armar a população contra os
criminosos; o fim das demarcações das terras indígenas, afinal, para que querem
tanta terra os índios se não produzem, não criam gado e não plantam soja e
milho para exportar?
O caminho para o progresso também foi restabelecido e
agora o país marcha a passos largos na direção de vencer a crise econômica e
voltar a crescer. As palavras de ordem são reduzir os gastos e atrair
investimentos. Como? Fazendo cortes nos programas sociais como o Bolsa Família,
uma vez que esse programa tem muitos desvios e acomoda os pobres que não querem mais
trabalhar; limitando gastos com saúde e educação, até porque o atendimento
universal do SUS precisa ser revisto, gasta demais e não funciona, e o piso
salarial dos professores está quebrando as prefeituras e governos estaduais;
terceirizando as atividades fins nas empresas privadas e no serviço público e
flexibilizando a legislação trabalhista, pois a CLT é atrasada e os encargos
sociais são pesados e emperram a economia; permitindo a compra de terras por
estrangeiros, pois vão trazer investimentos para o país; fazendo a reforma da
Previdência, pondo fim ao rombo nas finanças públicas causado pelo pagamento
dos vencimentos dos aposentados e pensionistas.
Há muitas outras propostas que a equipe ministerial
planeja executar, mas antes precisa concluir o processo de impeachment da
presidente afastada. Tudo visando o progresso... do capital financeiro e
rentista, das empresas e indústrias, do agronegócio. Chega de ideologia, chega
de preocupação social, de combate à fome e à miséria, de direitos humanos. Os
pobres já estavam indo longe demais, viajando de avião para cima e para baixo,
ingressando nas universidades e invadindo os shopping centers. Essa história de
cotas para negros e pobres só está prejudicando a formação profissional dos
mais preparados e capazes, que irão ajudar o Brasil a se tornar um país
desenvolvido. Menos ideologia e mais progresso.
Quanto à Operação Lava Jato, esta já pode ir
caminhando para o seu desfecho, visto que cumpriu bem o papel de criminalizar o PT,
partido mais corrupto da história do Brasil, e prender suas principais
lideranças. Não tem por que prosseguir, pois as denúncias que envolvem
outros políticos e partidos são meros indícios e ilações de delatores que só
querem se livrar da prisão. Onde já se viu envolver tantos políticos
tradicionais, homens honestos e bem relacionados, inclusive com os membros
insuspeitos da Suprema Corte?
Agora, sim. Abram alas para a passagem da tocha olímpica.
Vamos celebrar com festa os jogos que unem as nações, afinal nosso país trouxe
de volta a ordem e caminha novamente rumo ao progresso.
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