terça-feira, 28 de setembro de 2021

A polêmica sobre os aumentos dos combustíveis: de quem é a culpa?

 

 


 

Encher o tanque do carro está ficando, quase que semanalmente, mais dispendioso. O preço médio da gasolina subiu no Brasil pela oitava semana consecutiva, acumulando uma alta de 51% nas refinarias, e o litro na bomba ultrapassou em muito os R$ 6 e, em algumas cidades brasileiras mais de R$ 7, tornando-se um dos principais itens a impactar a inflação neste ano, elevando consideravelmente o custo de vida das famílias brasileiras, especialmente das camadas mais pobres da população. A alta dos combustíveis já levou 25% dos motoristas de aplicativo a desistir de trabalhar nas plataformas, o que vinha sendo uma alternativa de renda para muitos trabalhadores desempregados.

 

Tenho recebido, com frequência, mensagens de pessoas que cobram uma posição sobre a alíquota do ICMS da gasolina, algumas chegam a sugerir, inclusive, que eu apresente um projeto de lei para redução do imposto. Elas acreditam ser este o principal problema da alta dos combustíveis, aliás, ideia que foi amplamente difundida pelo presidente da República para desviar o foco da questão. Este assunto virou motivo de embate entre o presidente e os governadores, com o primeiro cobrando publicamente que os estados reduzam o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para que, dessa forma, os preços da gasolina e do diesel recuem. Além de explicar aos meus interlocutores que um projeto de lei dessa natureza não é da competência do deputado estadual, e que só pode ser de iniciativa do poder executivo, tenho procurado esclarecer-lhes que as constantes majorações dos preços dos combustíveis não têm relação com o imposto cobrado, mas com a política de preços adotada pela Petrobrás, desde o governo Michel Temer. Durante o governo Dilma, para se evitar uma escalada da inflação, evitava-se reajustar os preços dos combustíveis, e também da energia elétrica, utilizando a Petrobrás como uma forma de absorver os impactos de preços, evitando o repasse para o consumidor final. Foi uma política de subsídio governamental, para não onerar o custo de vida da população. Mas, voltando, caso o governo estadual optasse por reduzir o ICMS da gasolina, obviamente que haveria, num primeiro momento, uma queda nos valores praticados nos postos, porém os preços continuariam subindo posteriormente, como está ocorrendo agora. O que ocorre, então?

 

Por serem derivados do petróleo, os combustíveis acompanham o valor da commodity no mercado internacional, pressionado pela alta da demanda, à medida que as economias voltam a funcionar. Depois da crise provocada pela pandemia, a economia mundial deve ter um forte crescimento neste ano, o que aumenta a busca pela commodity (petróleo) e, consequentemente, ajuda a puxar os preços para cima. Além disso, temos uma forte desvalorização do real frente ao dólar, elevando a cotação do petróleo, que acarreta grande impacto no custo de vida dos brasileiros, passando a pagar mais caro por alimentos, energia elétrica e outros bens e serviços.

 

Precisamos entender que a formação dos preços da gasolina e do diesel hoje é composta pelo preço praticado pela Petrobrás nas refinarias, pelo custo do etanol adicionado aos demais combustíveis, mais os tributos federais (PIS/Pasep, Cofins e Cide) e estadual (ICMS), além do custo de distribuição e revenda. A variação de todos esses itens são o que determina o preço final nas bombas do combustível. Contudo, o principal fator de aumento dos preços hoje é o câmbio, ou seja, a desvalorização do real frente ao dólar, sendo que o petróleo já esteve num valor acima do atual, e o combustível não custava o que custa hoje. Essa perda de valor da moeda brasileira vem ocorrendo muito em razão das incertezas e descontroles da política econômica do governo federal, agravada pela crise política e institucional provocadas pelo presidente Bolsonaro, ameaçando a realização das eleições e os demais poderes com uma pretensa ruptura da ordem democrática. Este quadro da economia e da política no país afugenta investidores internos e externos, provocam a fuga dos dólares e impedem a valorização do real, que poderia contribuir com a queda do preço dos combustíveis. A demanda por real diminui, a demanda por dólar aumenta, e a moeda brasileira perde valor. Essa é a lógica do mercado.

 

Vejam que o problema é muito mais complexo do que cobrar dos governadores que abram mão do ICMS, que poderia impactar as finanças dos estados, sem resolver o problema de fundo. O imposto estadual, de fato, tem grande peso sobre o valor na bomba. A alíquota varia entre os estados: no caso da gasolina, chega a 30% em alguns locais, como é o caso do Mato Grosso do Sul. Essas alíquotas, no entanto, não subiram – mas o valor pago pelos consumidores sim. O imposto é cobrado em cima de uma estimativa de preço médio pago pelos consumidores; assim, se o preço sobe na bomba, os governos estaduais podem subir a estimativa de preço médio sobre o qual o ICMS incide. Porém, de fevereiro para cá, embora o valor pago em ICMS tenha subido, a participação do tributo no preço total da gasolina caiu: naquele mês, representava 29% de todo o valor pago na bomba; em agosto, era 27,5%, segundo dados da Petrobras.

 

Sendo assim, o fim dos aumentos dos combustíveis no Brasil depende de uma mudança na política de preços praticada pela Petrobrás, de um programa de retomada do crescimento econômico, que este governo não tem capacidade de produzir, e do fim das crises político-institucionais provocadas pelo presidente da República, que só se preocupa em alimentar sua base eleitoral com vistas as eleições de 2022. Como afirmou o próprio Bolsonaro, em discurso no dia 27/09: “Nada está tão ruim que não possa piorar”. E, infelizmente, vai piorar.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Especialista em fake news, Bolsonaro protagoniza show de mentiras na ONU e dá continuidade à sua pré-campanha eleitoral.


 

A expressão fake news passou a ser conhecida e amplamente utilizada em nosso vocabulário a partir de 2016, nas eleições americanas que elegeram Donald Trump, em razão da divulgação em massa nas redes sociais de muitas mentiras pelos apoiadores de sua campanha. Aqui no Brasil, a mesma estratégia eleitoral passou a ser utilizada nas eleições de 2018, contribuindo com a vitória nas urnas do então candidato, simpatizante de Trump, Jair Bolsonaro. E, para alimentar a rede de disseminação das notícias falsas, muito dinheiro foi investido na contratação de profissionais e na montagem da rede de multiplicadores das mensagens. E a prática continua de vento em popa, para tentar manter a base de sustentação do presidente na sociedade e criar os factoides, que têm por objetivo desviar a atenção da população dos problemas que seu governo não consegue resolver.

Desta forma, o que já temos clareza hoje é que, não se tratam apenas de notícias falsas que são divulgadas pelos profissionais da extrema direita. São conteúdos muito bem pensados e divulgados, com status de verdades, para alimentar seus apoiadores, que não têm o cuidado e a prática de checar a veracidade das informações que recebem, e passam a fazer o trabalho voluntário de reproduzi-los em seus grupos e contatos nas redes sociais. Ao receitar cloroquina para tratamento da covid, por exemplo, o presidente planejou uma situação para se alcançar a pretensa imunidade de rebanho no país, mesmo que tal objetivo custasse a vida de centenas de milhares de brasileiros. Trata-se de uma estratégia com objetivos políticos bem definidos, que forma uma base de apoio manipulada e pronta a fazer uma discussão, às vezes cega e irracional, em favor das ideias seu líder maior.

Foi assim que passamos a viver uma era de desinformação, de discussões rasas e apaixonadas, com argumentos mais na esfera da crença do que da ciência. Hoje está muito difícil debater com determinadas pessoas que navegam nas redes das fake news e que vêm o presidente da República como o homem de bem, apoiado em princípios cristãos, defensor da família tradicional e libertador da nação do perigo do comunismo. Bastou fazer um discurso como representante de valores morais e utilizar o slogan “Deus acima de todos” para conquistar amplo apoio entre evangélicos pentecostais e católicos tradicionalistas. E além de manipular o sentimento religioso nas pessoas, sabe muito bem direcionar a atenção da sociedade para falsos problemas e situações fabricadas, como o tratamento precoce contra covid, a polêmica do voto impresso, o possível golpe de estado no dia 7 de setembro, o STF que não o deixa governar, fazendo com que os problemas reais do país - inflação, desemprego, fome, miséria -, fiquem em segundo plano nas discussões.   

O show de mentiras e afirmações imprecisas do presidente ganhou, mais uma vez, o cenário internacional com a sua participação na abertura da Assembleia Geral da ONU, neste último dia 20 de setembro. Como se não bastasse o vexame de comer pizza na calçada com sua comitiva, em razão de ser impedido de entrar em restaurantes por não estar vacinado, o chefe de Estado brasileiro, em seu discurso de pouco mais de 10 minutos, tão somente acenou para sua base eleitoral no Brasil, tentando passar a ideia de um governo bem sucedido, exitoso na política econômica e ambiental e de enfrentamento à pandemia. Teve a audácia de defender, diante das delegações do mundo todo, o uso de medicamentos sem eficácia para a Covid-19, mostrando-se ainda favorável ao ‘tratamento precoce’ e contra medidas sanitárias mundialmente reconhecidas, como o lockdown, uso de máscaras e distanciamento social. Disse que não há corrupção em seu governo, mesmo com as revelações da CPI do Senado de esquema de compra de vacinas com preços superfaturados e pagamento de propinas; afirmou que o BNDES financiava obras em países comunistas sem garantias; que a legislação ambiental brasileira é a mais completa do mundo; que foram criados 1,8 milhão de novos empregos neste ano; que as manifestações de apoio ao seu governo em 7 de setembro foram as maiores da história do país; deu a entender que pagou um auxílio emergencial de U$ 800 mensal para pessoas de baixa renda. E, como não poderia deixar de fazer para completar sua peculiar oração, reafirmou os valores cristãos, defendeu a família tradicional e disse ter afastado o Brasil do socialismo.

É importante dizer que Bolsonaro não quis passar uma mensagem para o mundo. Os países conhecem muito bem a real situação que estamos vivendo em terras tupiniquins. Sabem da nossa crise econômica, do aumento da inflação, dos 14 milhões de desempregados, da volta do país ao Mapa da Fome, dos retrocessos na área ambiental e da desastrosa política de enfrentamento à pandemia, que já ceifou a vida de 600 mil pessoas. O presidente brasileiro ocupou a tribuna da Organização das Nações Unidas, maior entidade de articulação dos países para garantia da paz mundial, de enfrentamento aos conflitos entre as nações e de busca de soluções para problemas humanitários e de proteção aos direitos fundamentais dos povos, para dirigir-se aos seus apoiadores brasileiros e reforçar sua pré-campanha à reeleição em 2022. Quis, tão somente, reafirmar-se como homem de coragem para dizer o que disse perante o mundo, sendo o “mito” que seus eleitores conheceram em 2018 e que não abre mão de defender o que mais lhe importa, ou seja, ele mesmo. 

Para alguns setores da sociedade brasileira, o presidente só falou verdades e que o seu governo vai bem, ou seja, seus negócios vão muito bem obrigado. Enquanto a comida na mesa dos brasileiros fica cada vez mais cara; muitos tendo de cozinhar com álcool ou em fogão à lenha; a boiada vai passando no Congresso para caçar direitos da classe trabalhadora; nossas águas superficiais vão diminuindo, rios vão secando e as florestas vão sendo derrubadas ou ardem em chamas, alguns aumentam extraordinariamente seus lucros com exportações de comodities ou venda de medicamentos sem eficácia para a covid, e os serviços públicos seguem sendo transferidos para a iniciativa privada. Segue a passos largos o desmonte do Estado brasileiro, tornando difícil revertê-lo nas próximas décadas. 

Às pessoas de bom senso, àqueles que desejam ver um Brasil mais justo, mais solidário e garantidor dos direitos fundamentais das pessoas, aos que creem na democracia e na soberania do país, só há um caminho a percorrer neste momento: fazer a resistência democrática, defender a Constituição e as instituições políticas, exigir a apuração dos crimes de responsabilidade praticados pelo presidente da República e abertura do processo de impeachment e organizar a sociedade para o próximo pleito eleitoral, a fim de que seja a oportunidade de vitória de um projeto de reconstrução nacional e de políticas públicas de interesse da maioria da população brasileira, recolocando o país no cenário internacional como protagonista e não como subalterno dos interesses das grandes potências econômicas. Nossa vontade de mudar o Brasil não é fake news!

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Quem vai pagar pelas mortes das pessoas que se trataram com Kit Covid?

 


Estou me lembrando agora que, no auge da pandemia do Covid-19 no ano passado e no início deste ano, pelo menos em três ocasiões em que estive em farmácias para comprar medicamentos, escutei pessoas ao meu lado no balcão comprando Cloroquina e Ivermectina para realizarem “tratamento precoce” contra a doença. Em pelo menos numa ocasião o vendedor disse que os medicamentos estavam em falta devido à grande procura. Várias pessoas conhecidas minhas e, até mesmo familiares, fizeram uso destes medicamentos por conta própria, sem prescrição médica, porque ouviram dizer que preveniam sintomas mais graves em caso de contaminação com o novo coronavírus. É claro que essas pessoas foram influenciadas pela propaganda enganosa e criminosa promovida pelo governo Bolsonaro, seja por meio de pronunciamentos, lives e vídeos nas mídias sociais do próprio presidente, seja por recomendações do Ministério da Saúde, na contramão dos estudos científicos e orientações de especialistas da área da saúde, que concluíram pela ineficácia desses medicamentos para a prevenção ou tratamento da Covid-19. Bolsonaro, além de incentivar o uso de medicamentos sem eficácia comprovada, retardou o programa de vacinação no Brasil, pôs em dúvida a eficácia das vacinas, estimulou aglomerações enquanto cientistas orientavam o isolamento social e defendeu uma teoria de “imunidade de rebanho” sem qualquer respaldo científico.

Como é possível que um presidente da República, que não tem formação em medicina e conhecimentos técnicos na área possa prescrever medicamentos sem eficácia comprovada para uma doença nova e que ainda está sendo pesquisada em todo mundo por especialistas em saúde? Como pode um Ministério da Saúde de um país recomendar o uso de medicamentos, sendo que um deles podem apresentar efeitos colaterais graves em pacientes cardíacos, quando estudos científicos revelam ineficácia para a doença? Quanta irresponsabilidade! Quantas vidas se perderam por causa de tais procedimentos da parte dessas autoridades, que deveriam zelar pela correta condução das medidas de enfrentamento à pandemia, na perspectiva de preservar e salvar da morte as pessoas do seu país? Essas autoridades responderão por tais condutas?

A CPI da Covid no Senado Federal tem revelado situações muito graves envolvendo agentes do governo federal em conluio com lobistas e empresas, tanto em condutas negacionistas, desdenhando das medidas sanitárias recomendadas pela OMS, quanto em esquemas para o desvio de recursos públicos na aquisição de vacinas e de remédios sem eficácia para a doença. Muita gente lucrou com isso e, com certeza, muitas outras pessoas iriam se beneficiar com quantias vultosas, se não fossem pegas com a boca na botija.

Outro episódio que veio à tona recentemente, e que está sendo investigado por autoridades policiais, é o que envolve a empresa Prevent Senior, que promoveu um estudo irregular, antiético e criminoso, com falso tratamento precoce contra a Covid-19 e que matou nove pessoas, mas que impulsionou lucro recorde da empresa nos últimos cinco anos. Agora que ficou claro que cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina não funcionam – e, inclusive, podem aumentar a mortalidade por covid-19 –, a Prevent Senior passou a ser investigada pela CPI. Dossiê elaborado por médicos da empresa revelou protocolos indecentes, como impor remédios ineficazes aos pacientes nos serviços médicos do plano, submetê-los a tratamentos experimentais sem autorização de autoridades sanitárias e familiares e ocultar mortes em uma estudo feito irregularmente. A conduta da Prevent Senior não foi apenas um experimento feito por médicos negacionistas, que lembra, em certa medida, o “Estudo Tuskegee de Sífilis Não-Tratada em Homens Negros”, ocorrido no Alabama, Estados Unidos, de 1932 à 1972, e que foi uma das situações que mais contribuiu para o avanço da Bioética. Ela tinha outro propósito: dar dinheiro. Muito dinheiro. E teve como cúmplices pessoas influentes do mercado financeiro, que incentivaram e lucraram muito com a distribuição indiscriminada de kits covid para os pacientes. O protocolo de tratamento precoce da empresa teve muita propaganda grátis e o próprio presidente Bolsonaro divulgou os resultados do estudo irregular, que supostamente mostrava a eficácia da cloroquina. Desta forma, o estudo recebeu respaldo pseudocientífico e passou a alimentar no país a esperança de um tratamento que não existia.

A pergunta que fazemos é: quem vai pagar pelas mortes de pessoas que fizeram tratamento com o Kit Covid? Será que tudo vai ficar por isso mesmo?

domingo, 19 de setembro de 2021

100 anos de Paulo Freire: por que o patrono da educação irrita tanto os bolsonaristas

 


Por Vinícius Bacelar - 19/09/2021

 

Dia 19 de setembro de 1921. Há exatos 100 anos nasceu, em Recife, Paulo Reglus Neves Freire - ou, simplesmente, Paulo Freire - Patrono da Educação Brasileira. Um século depois de seu nascimento, Paulo Freire é homenageado por diversas autoridades e personalidades, como o ex-presidente Lula, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), o ex-candidato à Presidência da República, Guilherme Boulos (PSOL), o professor Silvio Almeida, entre outros.


Porém, por outro lado, bolsonaristas têm o atacado - não só hoje, dia do centenário de seu nascimento, mas há algum tempo. O próprio filho do presidente Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro, usou suas redes sociais para criticar uma recente decisão da Justiça, que proibiu o ataque à honra do educador. "Educação do país de péssima qualidade e não se pode nem criticar o patrono desta bagunça? Isso não é justiça, é militância doentia. Nunca foi tão difícil fazer o certo e consertar o Brasil. Mas nós somos chatos e estamos certos, então vamos adiante", disse o deputado federal (PSL-SP).

Vereador de Belo Horizonte, Nikolas Ferreira (PRTB) também desaprovou tal decisão: "A justiça está preocupada em proibir o governo de "atacar a dignidade" de Paulo Freire. E a dignidade de quem é vítima dessa pedagogia?", disse o parlamentar bolsonarista.

Ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub foi ainda mais contundente: "Bilionários que controlam empresas gigantes/monopólios são de esquerda. Drogas, Paulo Freire, aborto, a destruição da SUA da família, estão na agenda deles. NÃO É COINCIDÊNCIA! Nossa luta é contra isso!", postou em seu Twitter, junto a uma print da homenagem do Google ao patrono.


Mas por que os bolsonaristas se irritam tanto com o legado de Paulo Freire, mesmo após 24 anos depois de sua morte? O iG entrevistou o professor Thiago José de Biagio, mestre em história social, para entender tal obsessão. Para o especialista, a proposta pedagógica de Paulo Freire faz um contraponto à pedagogia tradicional e hierárquica. "Ele pensava na autonomia do ser humano, principalmente, o excluído. Pensava naquele que não tinha condições de se enquadrar - ou não queria se enquadrar - no modelo de educação burguesa, no qual o professor só vai depositando informações", argumentou Biagio.


O professor também citou o livro mais famoso de Freire: "A Pedagogia do Oprimido". "A obra vai ao encontro da ideia de emancipação do sujeito, uma consciência da condição social do oprimido. A proposta do Paulo Freire é de uma educação baseada no diálogo. Há um incentivo ao questionamento e à ação social. Portanto, o professor não é o topo da hierarquia, aquele que tudo sabe", continuou Biagio. "Ele prega que não haja o medo da liberdade. Inclusive, uma frase de Paulo Freire que representa esta proposta é 'Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor'”, pontuou o professor.


Em relação ao bolsonarismo, Biagio disse que o "ódio" é o combustível dos apoiadores do presidente, inclusive do próprio líder do Executivo brasileiro. "Para eles, só existe uma verdade. So existe uma forma de se comportar e enxergar o mundo, sendo que a pedagogia do Paulo Freire estimula a autonomia. Uma perspectiva tradicional de sociedade, como é defendida pelos bolsonaristas, defende que deva haver uma hierarquia, uma obediência militar, quase cega, em relação ao professor. Paulo Freire entendia que a educação precisava ser dialógica e que o professor devia escutar seus alunos também", justificou.


Biagio ainda afirmou que os bolsonaristas prezam por uma sociedade fatalista e de medo, enquanto o patrono da Educação Brasileira pregava a "esperança e a alegria". "Portanto, aquele oprimido, que está desesperançado, deve ter na pedagogia um meio de resgatar essa esperança", disse. Em entrevista à DW Brasil, o sociólogo Abdeljalil Akkari, da Universidade de Genebra, declarou: "A essência da obra de Freire é totalmente política, no sentido nobre do termo, não no sentido da política partidária. Por isso, em todas as regiões do mundo, sua obra é lembrada como algo muito interessante para refletir sobre o futuro da educação contemporânea", analisou.


Professor do curso de pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ítalo Francisco Curcio disse, também à DW Brasil, que os que rejeitam Paulo Freire, em grande parte, nem são especialistas em educação: "Eles acabam repetindo frases apregoadas por líderes com os quais se identifica. Isso é muito ruim. Quem padece é a própria população, desde a criança até o adulto", opinou.

Patrono da Educação Brasileira

O educador Paulo Freire (1921-1997) foi declarado oficialmente o Patrono da Educação Brasileira em 2012. A homenagem foi proposta pela então deputada Luiza Erundina (PSB-SP) e sancionada pela então presidente Dilma Rousseff, como a Lei 12.612/2012.

Paulo Freire nasceu no Recife em 1921, numa família de classe média, mas devido à crise econômica de 1929 e à morte do pai em 1934, viveu uma adolescência difícil. Apesar disso, conseguiu concluir os estudos e, em 1943, aos 22 anos, ingressou na Faculdade de Direito do Recife. Ele se formou, mas não chegou a exercer a profissão, preferindo dar aulas de língua portuguesa numa escola de segundo grau.

Em 1947, Freire assumiu o cargo de diretor de educação do Serviço Social da Indústria (Sesi), no Recife, quando passou a se interessar pela alfabetização de adultos e pela educação popular. Na década de 1950, foi professor universitário e concluiu o doutorado em Filosofia e História da Educação.

Nos anos 60, trabalhou com movimentos de educação popular e, no governo de João Goulart, coordenou o Plano Nacional de Alfabetização, com objetivo de tirar 5 milhões de pessoas do analfabetismo. Seu método, conhecido como “pedagogia da libertação”, tinha como proposta uma educação crítica a serviço da transformação social.

Em 1964, depois da ascensão dos militares ao poder, Paulo Freire foi preso e exilado. Morou na Bolívia, Chile, Estados Unidos e Suíça. No Chile, em 1968, escreveu sua obra mais conhecida: "A Pedagogia do Oprimido". Ao longo da década de 70, desenvolveu atividades políticas e educacionais em diversos países da África, Ásia e Oceania. Ele só retornou ao Brasil em 1980 com a Anistia.

Filiado ao PT, atuou em programa de alfabetização de adultos do partido. Em 1989, com a eleição de Erundina para a Prefeitura de São Paulo, foi nomeado secretário de Educação, cargo em que permaneceu até 1991. Freire morreu em maio de 1997.



segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Vai ser o Grito da Resistência e da conjugação coletiva nas ruas do verbo esperançar, por aqueles e aquelas que têm coração generoso e coragem de lutar!

 

Estou escrevendo este texto nesta véspera do 7 de setembro deste 2021, enquanto vejo pelas redes sociais pessoas tomando as ruas da capital federal e se manifestando, muitas eufóricas, outras destilando palavras de ódio e outras, ainda, parecendo ensandecidas como que participando de um “movimento revolucionário” para livrar o país do fantasma comunista. O que desejam com as manifestações estimuladas pelo próprio presidente da República e financiadas, certamente, pelos setores econômicos que estão satisfeitos com as exportações das commodities e com a precarização dos direitos da classe trabalhadora? Querem expressar seu apoio ao presidente, que governa com a ausência do Estado e pela máxima da liberdade do deus mercado; para que permaneça no cargo, mesmo que pela força das armas. Também querem o fechamento do Supremo Tribunal Federal e a morte de dois ministros, um deles por estar atuando no combate às afrontas à Constituição e ao Estado Democrático de Direito, e o outro por ter se manifestado contra a volta do voto impresso nas eleições. Parece inacreditável estarmos vivendo tudo isso, num momento em que o país atravessa uma grave crise, agravada pela pandemia, com a econômica à deriva, com inflação em alta e mais de 14 milhões de brasileiros desempregados.  

Na última sexta-feira, dia 3, Jair Bolsonaro elevou ainda mais o tom autoritário contra os poderes da República, em particular o Judiciário. Afirmou que o 7 de setembro servirá de ultimato aos ministros do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Ou bem eles se curvam à vontade “do povo” – ou seja, de Bolsonaro – ou ele e sua trupe jogarão fora “das quatro linhas da Constituição. Isso é uma ameaça de que, em caso de sua vontade não prevalecer sobre a lei e as instituições da democracia, vai se impor pela força? Será que teremos que ver aqui o que aconteceu nos EUA com a invasão do Capitólio por manifestantes igualmente eufóricos e ensandecidos, frustrados com a derrota do seu “mito” Trump? Acho que, se isso acontecer por aqui, será um vexame ainda maior.  

O presidente da República, que não para de criar factoides para desviar a atenção das pessoas da sua incapacidade para governar, dos crimes cometidos por membros de sua família e das denúncias de corrupção no seu governo, principalmente as reveladas pela CPI do senado, que investiga esquema de propina na compra de vacinas contra a Covid, alimenta seus apoiadores por meio da rede muito bem montada de disseminação de fake news e desperta nelas seus sentimentos mais irracionais de ódio aos pobres e a tudo que esteja ligado à luta por justiça social, respeito aos direitos humanos e convivência com as diferenças.

Mas, enquanto assistimos a estas cenas lamentáveis, estamos nos preparando para, também, sair às ruas em protesto. Há 27 anos, nós realizamos o Grito dos Excluídos no Brasil, que no início foi uma iniciativa da Igreja Católica e que depois passou a ser também organizado e realizado por movimentos sociais e sindicais de trabalhadores. Tive a oportunidade de participar de todos eles, nos primeiros anos como um dos organizadores pela arquidiocese de Campo Grande e agora como apoiador.

O Grito sempre se propôs a denunciar a desigualdade social em nosso país, que relega milhões de brasileiros, das cidades e do campo, indígenas e comunidades tradicionais, a condições de pobreza e miséria, impedindo-os de ter acesso aos seus direitos de cidadania e de viver com dignidade. Esta denúncia foi feita durante os governos da direita, da esquerda e, agora, da extrema-direita, e vai continuar até que tenhamos um país mais justo e solidário. Estaremos gritando por um país que promova o desenvolvimento econômico junto com o desenvolvimento social e que preserve o meio ambiente, nossa Casa Comum. Nosso grito é por vida digna para todos os brasileiros e brasileiras, sem exclusões, sem violências, sem discriminações e com liberdade e felicidade partilhada. Um grito das dores do povo que hoje sofre e que quer celebrar o amanhã da paz brotada da justiça. Grito por quem já não consegue mais gritar. Grito do silêncio daqueles que se foram pela pandemia transformada em genocídio por aqueles que brincaram de negar a ciência.

Neste ano, o Grito dos Excluídos, além de denunciar o aumento da pobreza, do custo de vida, do desemprego e da fome, o desrespeito ao meio ambiente, a tragédia da pandemia, vai ser um grito contra o autoritarismo e em favor da democracia, uma vez que esta vem sendo ameaçada pelo chefe da nação e seus apoiadores. Vai ser um movimento de resistência democrática, em defesa da vida, do SUS e por políticas públicas sociais para proteger os mais pobres. Vai ser o Grito da Resistência e da conjugação coletiva nas ruas do verbo esperançar, por aqueles e aquelas que têm coração generoso e coragem de lutar!